Discurso do Presidente da República sobre a política externa portuguesa
Em direto de Lisboa, cerimónia de tomada de posse no Palácio Nacional da Ajudado, discurso de Marcelo Rebelo de Sousa, presidente da República, sobre a política externa portuguesa na Apresentação de Cumprimentos ao Corpo Diplomático.
Resumo Analítico
"Temos neste momento em exercício o XXI Governo Constitucional desde 1976 o qual tem nas páginas 246 a 260 do seu programa uma definição pormenorizada dos objetivos para a nossa política externa nos próximos quatro anos.", "Temos ainda no mesmo programa, nas páginas 27 a 39 a descrição do trabalho que se propõe levar a cabo no âmbito da União Europeia." (...)"Em traços muito breves, podemos resumir que na geografia Portugal se situa no continente europeu, mas no centro da ligação entre os continentes europeu, americano e africano. Portugal tem em frente o oceano Atlântico e tem a sul uma ligação natural ao mar Mediterrâneo.", Portugal, com 92 mil quilómetros quadrados e 10 milhões e meio de habitantes, é um país de média dimensão no continente europeu. Estes são dados importantes logo à partida, pois ajudam depois a compreender também que historicamente para os portugueses o Atlântico nunca foi uma separação mas sim uma ponte e ligação ao resto do mundo. Foi pelo Atlântico que Portugal construiu desde o século XV (e mantém ainda hoje de outras formas) uma ligação fortíssima com África e com a América." (...) "A conjugação da nossa geografia com a nossa história dita-nos assim uma inabalável convicção nas relações transatlânticas bem como na ligação aos povos de língua portuguesa e vemos o continente asiático não como algo de distante mas um continente ao qual regressamos para negociar num espírito de paz e respeito mútuo, de parceria e de vantagens mútuas. Vemos no mundo muçulmano mais do que um vizinho, um antepassado, com o qual, mesmo em épocas de conflito medieval, sempre tivemos alianças pontuais, troca de ideias e de conhecimentos científicos e comércio constante." 0h07m25:" Como sabem, Portugal celebra o seu dia nacional a 10 de junho. Neste dia celebramos ainda o nosso maior poeta, Camões, mas também homenageamos as comunidades portuguesas espalhadas pelo mundo, já que estas têm desde há muito um papel extremamente importante no nosso imaginário afetivo"(...) "Quase todas as famílias portuguesas têm parentes que emigraram. É por isso quase um lugar-comum falar de Portugal como país de emigrantes, como uma terra de partida", "Estas comunidades, mesmo quando plenamente integradas nos países de acolhimento, e mesmo que não visitem Portugal durante vários anos, permanecem por regra extremamente ligados à sua cultura e identidade de origem." "Portugal deve muito às suas comunidades e Portugal não seria o mesmo sem o seu contributo. Estamos naturalmente orgulhosos dos nossos emigrantes e gratos pelo seu trabalho e esforço de divulgação da nossa língua e cultura." 02h09m23: "Não nos podemos esquecer que se Portugal foi sempre um país de partidas, também sempre foi simultaneamente um país de chegadas e de novas comunidades que aqui se integram, e que aqui lutam por uma vida melhor e que se tornam portugueses como os que cá estão e que juntos, todos juntos, contribuem para engrandecer este país e elevar bem alto a sua bandeira" (...)"Eu orgulho-me muito das comunidades portuguesas no estrangeiro!"; "Eu orgulho-me também muito das comunidades estrangeiras que se instalaram em Portugal e que são hoje tão portugueses como eu!. Considero que valorizar e promover as comunidades estrangeiras que se integram em Portugal é valorizar e promover Portugal no seu todo; Os portugueses são todos filhos de celtas, de iberos, de gregos e de cartagineses, de romanos e de visigodos, de suevos e de alanos, de árabes e de judeus, dos mais diversos povos de África a sul do Sahara e também de indianos e de chineses". 02h10m42: "Devo aliás referir, a propósito, que o Instituto de Patologia e Imunologia Molecular da Universidade do Porto, chefiado por um dos mais reputados patologistas do mundo, o Professor Sobrinho Simões, tem um estudo, já publicado em livro, sobre o Património Genético Português, que nos ajuda a conhecer com rigor científico pelo nosso ADN as nossas origens e por esta via a história dos povos passaram e ficaram em Portugal". 02h12m16: "Mariza: Esta senhora que interpreta de forma sublime a expressão mais profunda da alma portuguesa pela música, que é o fado, é uma portuguesa filha de África, onde nasceu, de mãe moçambicana. Tem sido imbatível na quantidade de prémios e distinções internacionais que tem recebido na divulgação do fado além-fronteiras; Naide Gomes: Nascida em São Tomé e Príncipe e naturalizada portuguesa já depois de adulta, Naide Gomes foi várias vezes campeã mundial no Pentatlo e no salto em comprimento em representação de Portugal. Nelson Évora: Que não pôde estar presente por estar a competir no estrangeiro mas que gostaria também de referenciar. Nasceu na Costa do Marfim e é de ascendência cabo-verdiana. Contudo foi a bandeira portuguesa que se levantou quando se sagrou campeão do mundo e campeão olímpico do triplo salto. Francis Obikwelu: É nigeriano de nascimento e português por opção. Encheu os portugueses de satisfação ao sagrar-se várias vezes campeão da Europa nos 100 e 200 metros e ao conquistar também a medalha de prata nos jogos olímpicos de Atenas nos 100 metros". Muito obrigado por honrarem Portugal e muito obrigado pela vossa presença. Saibam que são um exemplo e uma inspiração para todos os portugueses". 02h16m00: (...) "Mas a aposta de Portugal na União Europeia assenta numa ambição maior e que vai muito além dos aspetos materiais, por muito importantes que eles sejam. Portugal viu sempre na integração europeia, na coesão, na solidariedade e na democracia um modelo para a nossa própria sociedade. Estivemos por isso sempre na primeira linha dos que ambicionam uma União Europeia mais avançada, mais harmoniosa, mais unida e com um papel mais coeso na ordem mundial. Deste modo, estamos empenhados nos desafios que são colocados na União Europeia de forma particular a Portugal mas também acompanhamos com preocupação e solidariedade os dramas que se vivem com a chegada massiva de migrantes e refugiados ao nosso continente. Enquanto humanistas somos solidários com as dezenas de milhares de pessoas que passam pelo drama a que todos os dias assistimos. Enquanto Estados Membro da União Europeia somos solidários com os nossos parceiros especialmente afetados pelos enormes desafios que são colocados pela chegada massiva de pessoas que é preciso assistir e integrar". 02h17m20: (...) Pertencemos também ao Atlântico Norte e é uma constante da nossa ação externa a vontade de fortalecer a nossa participação na NATO e é impossível não estarmos atentos e apreensivos face ao fenómeno global do terrorismo. Este é um flagelo que, precisamente por sermos humanistas, temos de combater com determinação, e em conjunto, em prol do respeito pela vida humana mas também contra o obscurantismo e a intolerância. Queremos aprofundar cada vez mais as relações com o nosso aliado Estados Unidos da América, país onde reside uma grande comunidade portuguesa e com o qual temos uma excelente relação desde a sua fundação no século XVIII, tendo aliás Portugal sido o segundo país a reconhecer a sua independência". 02h19m50: "Portugal orgulha-se de ter sido eleito três vezes para o Conselho de Segurança das Nações Unidas, e mais recentemente para o Conselho dos Direitos Humanos. Pelo meu lado tenciono participar na Assembleia Geral das Nações Unidas já este ano, dando assim um sinal claro da continuidade da nossa aposta no multilateralismo; Não é por isso de estranhar que Portugal tenha apresentado a candidatura do Eng.º António Guterrres, antigo Primeiro-Ministro e Alto-Comissário das Nações Unidas para os Refugiados a Secretário-Geral das Nações Unidas. É uma candidatura a favor de todos, congregadora, baseada no extraordinário mérito do candidato e assente na certeza de que, caso seja nomeado, António Guterres será um brilhante Secretário-Geral das Nações Unidas, valorizará a ONU e fará com a inteligência e capacidade que todos lhe reconhecem a ponte entre todas as nações"; deixem-me acrescentar uma nota pessoal: É certamente o vulto mais brilhante da minha geração." 02h21m05: "Também no âmbito multilateral, Portugal dá a maior importância ao desenvolvimento da Comunidade dos Países de Língua Portuguesa e nunca deixaremos de nos esforçar para que esta Comunidade seja cada vez mais valorizada no contexto internacional. Sempre tentaremos contribuir para que a CPLP seja cada vez mais uma Comunidade de construção de novos laços económicos e sociais entre as suas sociedades, sem nunca esquecer os seus princípios fundadores, que é a língua portuguesa como elo de ligação entre todos e o respeito pelos direitos humanos como corolário de todos os seus Estados Membros. Temos no Mundo muçulmano em geral, e nos países do Magrebe em particular, uma secular relação de vizinhança, de trocas comerciais e culturais. Marrocos, Argélia e Tunísia continuarão a merecer uma atenção especial na troca de encontros tendo em vista o desenvolvimento desta antiga relação". 02h26m40: "Em suma, a política externa portuguesa tem sido sempre uma política de consenso e de continuidade e na qual há uma tradição e harmonia e colaboração frutuosa entre Presidente da República, Governo e Assembleia da República. Sempre estivemos juntos. Exercerei assim o meu cargo no que às relações internacionais diz respeito no estrito cumprimento da Constituição e dos compromissos internacionais por nós assumidos. Mais do que manter, tentarei sempre aprofundar a relação de colaboração frutuosa com o Governo e com a Assembleia da República para que assim alcancemos os objetivos que são de todos nós na nossa ação externa. Estarei sempre interessado, disponível e empenhado, para em conjunto irmos mais longe na afirmação de Portugal na cena internacional". 02h27m49: "Antes de ser eleito eu mantinha com muitos de vós uma relação de contacto regular, e até de amizade, que muito me satisfazia; Imagino que muitos de vós se questionarão como será agora que fui eleito Presidente da República, será que a relação vai mudar". Pois posso assegurar-vos que a amizade se manterá e o contacto poderá até ser reforçado, e isto porque agora, como Presidente da República terei ao meu dispor uma assessoria diplomática que me ajudará a manter com todos vós uma relação ainda mais regular e ainda mais intensa". 02h28m39: "Posso adiantar que irei até promover, conjuntamente com o Senhor Ministro dos Negócios Estrangeiros e com a minha assessoria diplomática, encontros com os chefes de missão nos respetivos grupos regionais com que se organizam em Lisboa. Começarão a ser, também por isso, contactados oportunamente pela minha assessoria diplomática. Gostamos de ouvir as vossas opiniões e pretendemos otimizar o vosso papel como elo de ligação de Portugal aos vossos países. Sei que a tarefa a que nos propomos em termos de política externa parece desmesurada face aos nossos meios, que parece quase megalómana, (...) mas como disse Fernando Pessoa: "Valeu a pena? Tudo vale a pena se a alma não é pequena. Quem quer passar além do Bojador tem de passar além da dor. Deus ao mar o perigo e o abismo deu, mas nele é que espelhou o céu."